Banco Central anuncia reformulação do Drex e adiamento da moeda digital

 

Banco Central anuncia reformulação do Drex e adiamento da moeda digital

O projeto Drex, idealizado pelo Banco Central como uma moeda digital para modernizar o sistema financeiro nacional, chegou a ser celebrado como uma revolução na forma de lidar com transações e inclusão bancária. No entanto, dois anos após seu anúncio oficial em 2023, o Drex perdeu o brilho e passou a ser motivo de críticas, desconfiança e incertezas.

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O adiamento da entrega para 2026, o abandono do uso de blockchain na primeira versão e a ausência de debate público sobre o projeto colocam em xeque sua viabilidade e relevância. Ao invés de representar inovação, o Drex parece caminhar para se tornar uma infraestrutura técnica de bastidores, com funcionalidades que pouco tocam o cotidiano do cidadão comum.

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Drex
Imagem: rafapress / shutterstock.com

A promessa do Drex: modernizar o sistema financeiro

Objetivos iniciais

O Drex nasceu com ambições elevadas: reduzir o custo das transações financeiras, facilitar o acesso a serviços bancários, integrar a tokenização de ativos e oferecer uma moeda digital oficial, segura e confiável. O projeto também era visto como um passo além do Pix, ao permitir liquidações instantâneas em diversos ambientes financeiros.

Apresentado como uma CBDC (Central Bank Digital Currency) moderna, o Drex previa o uso de blockchain permissionada, contratos inteligentes e integração com outras plataformas digitais.

Inclusão financeira e inovação

O foco também era atingir populações não bancarizadas, ampliar o acesso a investimentos fracionados e facilitar a emissão de ativos digitais, como imóveis tokenizados. A proposta de interoperabilidade com instituições financeiras, fintechs e marketplaces foi bem recebida, inicialmente.

Reformulação surpreende o mercado

Anúncio de Gabriel Galípolo

Em agosto de 2025, durante o Blockchain Rio, o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, anunciou a reformulação do Drex. A principal mudança foi a remoção do uso de blockchain na primeira versão, justificando a decisão com desafios técnicos e preocupações com a privacidade dos usuários.

A nova abordagem trata o Drex como uma infraestrutura para reconciliação de gravames — um mecanismo de bastidor para garantir que ativos digitais sejam liquidados de forma segura, mas sem impacto direto ao consumidor final.

Contradição com posicionamentos anteriores

O anúncio pegou o mercado de surpresa. Em 2023, o próprio Banco Central divulgava o Drex como uma CBDC de vanguarda, com base em blockchain. O código-fonte publicado no GitHub exibia funcionalidades como congelamento de contas e alteração de saldos, o que já levantava suspeitas de excessivo controle estatal.

Agora, com a reformulação, as dúvidas aumentam sobre a real função do Drex e os critérios usados para justificar essa guinada no projeto.

Reações do setor

Especialistas, desenvolvedores e entusiastas do setor de criptoativos classificaram a decisão como um retrocesso. Ao abandonar o blockchain — tecnologia que assegura transparência, rastreabilidade e descentralização — o projeto perde seu diferencial inovador e se afasta das tendências internacionais.

Críticas à transparência e ausência de regulação

Falta de debate público

Diferentemente de outros países que adotaram moedas digitais estatais, o Brasil não realizou consultas públicas ou debates legislativos amplos. Países como Suécia e Bahamas organizaram audiências, pesquisas com a população e discussões em seus parlamentos antes da adoção de uma CBDC. No Brasil, o projeto avançou de forma unilateral, sem escuta social.

Proposta de Emenda Constitucional

A insatisfação com essa abordagem culminou na proposta de uma PEC apresentada pela deputada Júlia Zanatta (PL-SC), exigindo que qualquer implementação do Drex passe obrigatoriamente pela aprovação do Congresso Nacional. A proposta ganha força entre parlamentares que criticam o modelo centralizador do Banco Central.

Riscos à privacidade

A possibilidade de um Drex com capacidade de rastrear e congelar contas, como indicado no código de 2023, gerou críticas de especialistas em direitos digitais. A ausência de regras claras sobre o uso dos dados dos usuários também alimenta preocupações com a privacidade e o controle governamental excessivo.

O vácuo regulatório do mercado de criptoativos

Criptoativos
Imagem: Chinnapong / shutterstock.com

Lei 14.478/22: avanço que parou no tempo

A legislação brasileira sobre criptoativos, sancionada em 2022, definiu que o Banco Central será o regulador de corretoras e exchanges. No entanto, o processo de licenciamento e fiscalização ainda não foi implementado em 2025, o que cria um ambiente de insegurança jurídica.

Travel Rule e segregação patrimonial

Normas internacionais, como a Travel Rule (que exige o compartilhamento de informações entre entidades que realizam transferências de criptoativos para coibir lavagem de dinheiro), ainda não foram aplicadas no país.

A segregação patrimonial, que protege os ativos dos clientes em caso de falência das corretoras, também carece de regulamentação. A ausência dessas diretrizes prejudica o desenvolvimento de um mercado saudável e competitivo de criptoativos no Brasil.

Foco desviado

Enquanto o Banco Central concentra esforços no Drex — um projeto cada vez mais criticado — o restante do ecossistema digital brasileiro sofre com a falta de políticas públicas claras e regras operacionais. Investidores, startups e plataformas aguardam uma posição oficial que não chega.

Comparações internacionais

China, Bahamas e União Europeia

Outros países já implementaram moedas digitais com diferentes propósitos:

  • China: usa o yuan digital para ampliar o controle sobre o sistema financeiro.
  • Bahamas: implementou o Sand Dollar para promover inclusão em regiões isoladas.
  • União Europeia: discute seu euro digital em paralelo à construção de um arcabouço legal para criptoativos, com o regulamento MiCA.

O Brasil, por sua vez, priorizou o Drex sem completar o ciclo regulatório dos ativos digitais — uma inversão de prioridades que compromete a credibilidade do projeto e o posiciona como uma anomalia no cenário global.

O Drex como infraestrutura de bastidor

Redefinição do escopo

Com a nova definição, o Drex não será utilizado diretamente pelos cidadãos. Seu foco estará na infraestrutura de liquidação e reconciliação de ativos tokenizados entre instituições financeiras. Ou seja, a promessa de uma moeda digital para o povo foi substituída por uma arquitetura técnica voltada ao backoffice do sistema bancário.

Impacto limitado no cotidiano

Sem interação direta com o público e sem os benefícios anunciados — como inclusão financeira, redução de custos e integração com o Pix — o Drex corre o risco de se tornar apenas uma vitrine tecnológica sem função prática.

O futuro do Drex: promessas não cumpridas

Drex
Imagem: rafapress/ Shutterstock.com

Adiamento para 2026

O prazo original previa o início da operação em 2024. Com o recente adiamento, o Drex deverá estar disponível apenas em 2026 — e, ainda assim, em uma versão sem blockchain e sem funcionalidades voltadas à população.

Ceticismo crescente

A comunidade financeira e os especialistas em tecnologia expressam crescente desconfiança quanto ao real objetivo do projeto. Sem clareza sobre seu uso, sem regulação complementar e sem adesão popular, o Drex passa a ser visto como um projeto esvaziado de significado.

Possível saída legislativa

A PEC que obriga a aprovação do Congresso pode trazer um freio à implementação sem debate. Ao envolver o Legislativo, o projeto pode ganhar mais legitimidade — ou ser suspenso por completo, caso o modelo atual não seja aprovado.

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